Chile demonstra ser um dos países vitícolas que mais tem se reinventado nos últimos anos. As regiões vinícolas chilenas se expandiram além do tradicional vale Central e novos vales passam a ganhar protagonismo no cenário nacional. Da mesma forma, uvas pouquíssimo conhecidas ou valorizadas estão tornando-se estrelas do novo vinho chileno.
Há cerca de duas décadas, a vocação chilena para vinhos parecia estar resumida a tintos potentes de Cabernet Sauvignon, Merlot e Carmenere, com suas típicas notas herbáceas e mentoladas. Pouco tempo depois o Chile mostrou ao mundo que seus vales costeiros são o habitat ideal para variedades de uva de clima frio como Chardonnay, Pinot Noir e Sauvignon Blanc. Vinhos de belíssima acidez, exuberância aromática e mineralidade, tornando-se referencias mundiais.
Incansáveis, os chilenos souberam superar adversidades da natureza como terremotos que abalaram este estreito país de forma severa e rapidamente se reconstruíram. E se renovaram. A começar pelas fronteiras cultiváveis do país que cada vez mais se distanciam – sentidos norte e sul – da capital Santiago. Vales que até então eram focados na produção de uvas pisqueiras ou para vinhos de mesa hoje estão sendo revalorizados e cada vez mais almejados por produtores locais.
Ao norte, o vale do Limarí, com seus solos calcários e forte influência marítima, está originando brancos vibrantes que vão demonstrando complexidade a medida que envelhecem. Ao sul, o vale do Itata com cerca de dez mil hectares plantadas também passa por um processo de revalorização, produzindo surpreendentes vinhos feitos a partir da tinta Cinsault, pouco comercial, que ganha versões varietais em tintos e rosés, além de saborosos brancos secos de Moscatel de Alexandria.
Destaque também para as videiras centenárias da uva País, chilena por adoção e pouquíssimo difundida internacionalmente. A uva deixou os bastidores e passou a ser a base de projetos de enólogos criativos que hoje produzem vinhos cultuados por sommeliers e enófilos. Tanto pela originalidade dos caldos quanto pela versatilidade no momento da harmonização. Vinhos fluídos, de bela acidez e curiosos aromas condimentados que lembram curry, como o do projeto boutique da Viña Artesanal Gonzales Bastias.
Outro exemplo bem sucedido deste trabalho de resgate são as vinhas velhas de Carignan, plantadas na metade do século passado no interior do extenso Vale do Maule. Através do projeto batizado “Vigno – Vignadores de Carignan”, doze vinícolas chilenas – entre elas De Martino, Undurraga e Morandé – buscam envidenciar esse patrimônio chileno até pouco ignorado. O resultado são tintos com ricos aromas a frutas silvestres, muito equilibrados e redondos no paladar. Vinhos suculentos, provam que vale a pena sim ousar, reinventar-se, buscar o novo mesmo que isso signifique resgatar tradições outrora esquecidas.